• terça-feira, 5 de outubro de 2010

    TRILHAS DE UMA MOBILIZAÇÃO

    25 anos de Dia Nacional da Juventude

    Hilário Dick
    Uma mobilização tem história? “Mobilização” é uma convocação ou estimulação da população ou de determinados grupos sociais para participarem de alguma atividade seja religiosa, cívica ou política. Podemos dizer, portanto, que o Dia Nacional da Juventude (DNJ) é uma mobilização que se repetiu, anualmente, durante 25 anos. Um fato que acontece uma vez ao ano, teria uma coluna que o sustente? Seria o mesmo que acontece com (por exemplo) a festa do Divino que a paróquia celebra todo ano? Mas, se esta mobilização acontece em milhares de locais, com o mesmo tema e lema, mesmo subsídio, vestido dos trajes locais, protagonizado pela juventude, tendo como preocupação a juventude na sociedade?
    Falar dos 25 anos do Dia Nacional da Juventude no Brasil ou, mesmo, no Rio Grande do Sul ou outro Estado, é falar de uma “mobilização” e não deixa de ser um pouco estranho. “Estranho” porque é nos temas que se discutem nele, parece esconder-se a “alma” da juventude vivendo sua fé cristã. No último domingo de outubro, de todos os anos, por decisão de uma organização, acontece uma mobilização de jovens, chamando a atenção, dos jovens e da sociedade, de uma questão que os aflige... É caminhada, é concentração, é romaria nalgum lugar, com muito jovem, muita bandeira, muito canto, encenações, celebrações, diversas delegações com camiseta, com hino, com bonés específicos, com coisas para vender, com visitas a serem feitas no espaço, com palestrantes, grupos musicais e cantores convidados. É palco, é grupo que anima e é muito jovem caminhando, cantando, ouvindo, todos girando em torno de um mesmo tema. O que falar de 25 anos de uma mobilização como o Dia Nacional da Juventude?
    Tudo começou em 1985, declarado pela ONU como o Ano Internacional da Juventude. Já que ninguém tomava esta bandeira, a TV Globo promoveu, no Rio de Janeiro, um mega evento de Rock, uma mobilização isolada, com bandas importantes, com milhões de jovens e toneladas de drogas dizendo que era para comemorar o AIJ... Lideranças da Pastoral da Juventude do Brasil deram-se conta do que sucedia e, indignados e decididos, se perguntaram: É isso o AIJ? É isso que é a juventude? A juventude não tem outro discurso para a sociedade? Com o primeiro lema que dizia “construindo uma nova sociedade” decidiram começar a celebrar a juventude, todos os anos, no final de outubro, com o que chamaram de Dia Nacional da Juventude. Queriam discutir a juventude do jeito deles, assumindo temas que lhes pareciam importantes.
    Lembro-me que, por causa disso, do que se deu (por exemplo) em Passo Fundo (RS), quando se realizou um encontro de 45 mil jovens, tendo como tema o jovem da roça. Ao ritmo da gaita do P. Otávio Klein e dos violões de centenas de jovens cantou-se, naquele outubro de 1985, um canto que ficou na memória de muitos: Não é preciso ser filho de doutor; Jovem da roça também tem valor. O encontro havia sido preparado com subsídios e os que estavam no Seminário Aparecida, na entrada da cidade, sabiam por que estavam lá. Foi o começo, em muitos lugares do Brasil. Os primeiros temas que apareceram como sustento das mobilizações foram Terra, Eleições, Participação, Mulher, Negro, Índio, não se esquecendo que era fundamental a juventude envolver-se na elaboração da nova Constituição do Brasil, aprovada em 1988.
    E o evento (a mobilização) começou a ser tradição junto à Pastoral da Juventude e, também, junto à Igreja do Brasil que tomou o evento como uma “atividade permanente” da CNBB. Sempre havia um tema escolhido com antecedência, com seu lema; havia um hino oficial; imprimam-se milhares de subsídios espalhados por todo o Brasil. Em 1989 o tema foi Educação; em 1991 América Latina (por causa do 1º Congresso Latino-Americano em Cochabamba -Bolívia); em 1992, Ecologia; em 1993, AIDS. Eram assuntos que interessavam e sobre os quais os jovens eram convidados a refletir. E muitos o faziam com garra e criatividade. Interessante que, em 1994, o tema foi Cultura, com o lema “Nossa Cara, Nossa Cultura” com grandes concentrações. No RS (só para citar do que me lembro) houve, novamente em Passo Fundo, no mesmo local de 1985, um “Encontrão” de cerca de 50 mil jovens passando o dia com o tema sendo mastigado de várias formas. No meio das vibrações e das bandeiras, como é bom recordar Dante Ledesma fazendo cantar os jovens vindos de todos os cantos do Estado... O pregador era Dom Mauro Morelli, bispo de Duque de Caxias (RJ). O fato de o tema ser “Cultura” não era por acaso. É que o mundo dionisíaco acabava de tornar-se hegemônico, substituindo manifestações apolíneas. Recorde-se, por isso, a forma como o presidente do Brasil sofreu impeachement, em 1992, com a juventude se pintando com as cores do Brasil, sem muito discurso.
    De 1995 ao ano 2000 os temas que tomaram conta dos subsídios era Cidadania (vida, poder), Direitos Humanos (liberdade e desejo de mudança) e Dívidas Sociais (trabalho e terra). Sempre eram temas que iam para além da sacristia porque, afinal, o Dia Nacional da Juventude, desde o início, quis ter aspecto de igreja inserida no mundo, com espírito missionário, com os jovens dos grupos querendo dizer algo para fora dos muros da sacristia.
    A partir de 2001 surgia um outro discurso: o discurso das juventudes lutando pelos seus Direitos. Por isso o mesmo tema, com tonalidades diversas, foi – de 2001 a 2005 – Políticas Públicas para a Juventude. Seria por acaso que, em 2003, surgia, ligada à Presidência da República, a Secretaria Nacional da Juventude? Os temas que aparecem é Paz, é Educação para a vida, o trabalho e a cultura, é Missionariedade, é Emprego e Lazer e é a questão do Protagonismo. Fica evidente que eram temas indo além dos muros eclesiásticos, com consciência que a verdadeira Igreja não existe para si mas que ela é Sacramento do Reino.
    De 2006 a 2009 os temas tratam do Brasil Popular, do Meio Ambiente, dos Meios de Comunicação, do Extermínio da Juventude para, em 2010, fazer – como diz o subsídio – “com muita reza, muita festa, em marcha contra a violência”, a memória do que já se viveu em 25 anos, procurando ser uma juventude cristã marcando presença na sociedade.
    Concluindo, pode-se dizer que atrás dos temas dos Dias Nacionais de Juventude se esconde a história deles. Os temas nunca foram intra-eclesiais. Os DNJ´s encarnam o espírito missionário dos grupos de jovens das Pastorais de Juventude do Brasil falando das realidades que machucam a juventude e o povo em geral, e que nunca foram, simplesmente, um “para nós”, mas um “para a juventude”, vivendo a vocação de fermento na sociedade. Só quem compreende este espírito vai compreender porque o DNJ não tem e nunca teve como temas centrais Jesus Cristo, Igreja, Sacramentos, Eucaristia ou outros temas mais teológicos. Não que se negue a esses, mas o que se afirma é a necessidade de apresentar uma Teologia e uma Espiritualidade que se mistura com a realidade juvenil e do povo.

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